terça-feira, 11 de maio de 2010

Afastar uma mulher é mais difícil que conquistá-la


Por Paulo RebêloDe São Paulo (SP)

A gente se preocupa demais em conquistar as mulheres. Sempre sob a doce ilusão de que somos nós os responsáveis por cativá-las o interesse.
O difícil não é conquistar. Nem manter a continuidade da conquista. É exatamente o oposto: fazer com que elas percam o interesse na gente e tomem a decisão de ir embora por conta própria. Fica o desafio a quem quiser arriscar.
Os homens tendem a achar que, quando se perde o interesse por alguém, basta ir ali comprar cigarro ou arrumar outra. Azar nosso e delas, pois a maioria das mulheres pensa diferente.
Porque a feiúra é o ícone da paixão irracional. Se beleza não põe mesa, mas abre o apetite, para elas a fome é multifacetada.
Quantos homens feios você conhece que estão com mulheres maravilhosas? Uma centena. Já fui um deles. E não sei explicar. Ninguém sabe. O olho de Thundera feminino vai muito além de personalidade ou inteligência.
No auge da minha juventude e de uma vã filosofia de botequim, imaginei que se eu procurasse ficar muito feio, talvez tão feio quanto o Cegonha, eu voltaria a ficar solteiro sem o peso na consciência de acabar o relacionamento com uma moça linda, inteligente e que gostava muito de mim.
Deu sorte, consegui o impensável: ficar mais feio do que já era. Deu zebra, consegui o improvável: ela passou a gostar ainda mais.
Parei de tomar banho antes de sair à noite nos finais de semana. Na época (período cretáceo) eu jogava bola e pedalava feito maluco. Esperei uma reclamação, mas tudo que ouvi foi "adoro cheiro de pele".
Aboli tênis e sapatos, passei a sair apenas de chinelo e com camisas velhas. Esperei um puxão de orelha, mas descobri que ela adorou o novo visual roots-maconhão. Até hoje uso as mesmas camisas que usava há quinze, vinte anos. Remendadas ou furadas.
Tentei de tudo para assustá-la, não deu certo. Até que acabei o namoro para carregar o peso na consciência até hoje.
E assim os anos e as mulheres foram passando. E o homem feio ficando ainda mais feio.
Parei de fazer a barba e, azar o meu, terminei gostando tanto quanto elas. Hoje sou o sapo barbudo que assusta criancinhas na piscina.
Parei de jogar bola e pedalar.
Engravidei de banha e colesterol. Tenho um filho de dez anos chamado gastrite, outro de cinco anos chamado esofagite. E abortei um, com quase nove meses de gestação, chamado laringite.
Ainda hoje, passados tantos anos, me assusto com tantas mulheres que gostam de uma pança fofa e peluda. Pior que eu também gosto da minha protuberância fronto-abdominal, é ótimo para colocar a caneca de cerveja em cima sem derrubar. Ou o prato de comida em frente à TV.
Troquei a água mineral pelo rum, os sucos pela cerveja, o guaraná pelo uísque. E elas às vezes adoram o bafo de cana, é impressionante. Aprendem a beber e a diferenciar uísque e vodca de qualidade.
Você pode seguir minha aula de história para acabar seu relacionamento. Talvez funcione, mas nada garante que ela vá parar de ter esperanças que você mude e volte.
Tem a traição. Não duvide se, traição consumada, ela diga que vocês podem conversar e resolver a questão de modo civilizado, deixar o erro para trás e olhar para frente.
Tempos passados, ainda imaginei que os homens feios tivessem sorte apenas com uma determinada faixa etária. A sociedade me provou ser apenas outra doce ilusão.
Ninfetas, balzaquianas e pequenas burguesas se encantam do mesmo jeito pela nossa feiúra.
Você arrota, peida, ronca igual a um trator velho, come uma fileira de costelas de boi, detona um porco inteiro na grelha, esquece o forno ligado quando vai dormir, chega atrasado no aniversário dela e não vê a menor diferença quando ela apara dois centímetros da franja.
E elas continuam achando você lindo.
Vá entender. Será o feio o new beautiful? Não sei. Mas sei que os homens ainda não chegaram neste avançado estágio da evolução. Conosco não funciona. Por favor, não engordem tanto. E voltem a usar vestidos.

Terra Magazine

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